Sexta-feira, dia de escolha do blog da semana, não me foi difícil render-me de imediato a esta minha opção. Primeiro, porque relaciona jornalismo e blogoesfera, depois porque tem uma indiscutível actualidade, finalmente porque é assinado por uma das mais notáveis repórteres que a imprensa portuguesa publica. O blog chama-se Diário de Reportagem e não é mais nem menos do que a soma de trabalhos e crónicas que Alexandra Lucas Coelho tem editado no jornal Público a partir de Israel e da Palestina.
Alexandra é uma jornalista experimentada na matéria, tem até publicado um livro, Oriente Próximo, que é justamente o resultado do seu trabalho jornalistico em Israel e nos Territórios Palestinianos Ocupados entre 2002 e 2007. Não admira, portanto, que volte ao local do crime para cobrir a situação dramática que se vive actualmente naquela zona do globo.
Sendo embora a reprodução dos textos que vão saindo no Público, o blog tem a vantagem de juntar todos no mesmo espaço, de forma organizada, numa sequência diária que nos dá uma visão mais panorâmica dos factos. E inclui crónicas mais pessoais, como esta deliciosa que aqui trago:
“Vi Obama tomar posse num quarto em Jerusalém. Gosto deste quarto. Foi nele que dormi a primeira vez que aqui aterrei. Vim do aeroporto ao amanhecer, tudo parecia prestes a explodir. Bombistas suicidas entravam em autocarros e cafés, o exército israelita entrava nas cidades palestinianas, a morte saía muito à rua. Era Abril, 2002. Subi os degraus com a mala, havia um jardim, uma casa antiga de pedra. Deitei-me a ouvir – seriam tiros? E o dia seguinte nunca mais acabou, até hoje.
Voltei muitas vezes, sem nunca mais dormir neste quarto, e agora não pedi, foi um acaso.
E portanto às seis e meia da tarde em Jerusalém liguei a CNN para ver Obama. Tinha acabado de voltar de Ramallah, e tanta gente estava agora a fazer isto, ligar a televisão para ver Obama – em Jerusalém, Belém, Hebron, Nablus, Jenin, Ramallah.
Gaza menos. Falta electricidade. (...)
Antes ainda do discurso de Obama, quando Aretha Franklin estava a cantar, telefonei a um entrevistado em Ramallah. Mas a canção foi curta, e ele queria mesmo não perder Obama.
E então deve ter ouvido como eu as vezes que Obama falou da liberdade. Foram três vezes:
“… essa grande dádiva da liberdade...”
“… o que homens e mulheres livres podem conseguir quando a imaginação se junta ao objectivo comum, e a necessidade à coragem...”
“… essa promessa de Deus segundo a qual todos são iguais, todos são livres e todos merecem uma oportunidade de lutar pela sua medida completa de felicidade.”
Parece-me um bom programa para a reconstrução de Gaza. É exactamente disto que se trata, mesmo dando como certo que Obama não estava a pensar em Gaza.
É bom que no dia em que esta crónica saia eu já não esteja neste quarto”.
Pérolas de uma jornalista brilhante que estão agora ao alcance de um clique em diarioreportagem.blogspot.com. O mundo fica mesmo mais perto quando se pode ler pessoas como a Alexandra.