Quem ouve regularmente a Janela Indiscreta sabe que há blogues mais citados do que outros – e na maioria dos casos, isso sucede pela mistura oportuna de qualidade na opinião com actualidade. Ou seja: os blogues que estão sempre em cima dos temas de actualidade, e que a isso juntam bem escrever e bem pensar, ganham vantagem na hora de escolher os bocados de cada dia. Um dos blogues que cumpria os dois preceitos, e com mais valor por ser de um homem só, era o Tomar Partido, do ex-dirigente do CDS Jorge Ferreira, agora ligado á Nova Democracia de Manuel Monteiro.
Não imaginava que Jorge Ferreira estivesse doente, porque a produção de posts continuava regular e atenta. O ultimo post foi publicado na quinta-feira e ironizava a respeito do défice de 8% do produto interno bruto (PIB) do mesmo Governo que passou a campanha eleitoral a dizer que tinha posto em ordem as contas publicas.
Pelos vistos, o computador acompanhou-o até ao Hospital - Jorge Ferreira morreu no sábado, com apenas 48 anos, e deixa assim, em suspenso, o seu Tomar Partido tantas vezes aqui citado. É um sensação estranha, esta, a de entrar num blog que está activo, em silêncio, é certo, mas activo, sabendo que o seu autor já não está entre nós.
O jornalista Pedro Correia, no Corta-fitas, cita Jorge de Sena: “nenhuma morte é natural. Fomos feitos para a vida, não para a morte. E se há pessoa que conheci sempre com imenso amor à vida foi o Jorge Ferreira.(...) O Jorge estava doente há dois anos, mas sempre enfrentou a doença como travou tantos debates políticos ao longo da sua vida parlamentar, como presidente da bancada do CDS: de frente, com coragem e tenacidade. Com o mesmo desassombro que revelou quando rompeu com o partido em que militava desde a adolescência, em desacordo profundo com Paulo Portas. Com a mesma franqueza e a mesma determinação que utilizava para escrever no seu blogue, Tomar Partido”.
António Balbino Caldeira no blog Do Portugal profundo, recorda-o como um “dos políticos percursores nos blogues (e mais tarde também para o Facebook), sem a poeira da vaidade, dos primeiros a fazer radar de notícias, lincando os novos sem notoriedade precedente”. No Câmara de Comuns. Paulo Ferreira sublinha o carácter do politico: “Mesmo que não concordássemos com tudo aquilo que o Jorge nos ia escrevendo, sabíamos que sempre que o fazia erguia mais alto a sua sinceridade e frontalidade – ler o Jorge era e sempre será um hino à Liberdade. Aos lermos o Jorge aprendemos que a liberdade não é património da esquerda, nem da direita, simplesmente da democracia”.
No mesmo blog se recorda um post de Jorge Ferreira, em Março, citando Jorge de Sena: “Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém vale mais que uma vida ou a alegria de té-la”.
“Nunca teve medo de tomar partido”, escreve Diogo Belford Henriques: “Contra ele debati e discuti, no CDS há anos atrás e nos blogues mais recentemente. Sempre soube que viria resposta forte, de um adversário que não desistia de defender o que acreditava. Sempre a recebi, que Jorge Ferreira não era homem de ficar sem dar resposta: assertiva, irónica por vezes, mas sempre de forma correcta”.
É essa voz que desaparece – e é esse blog que fica em suspenso, num vazio difícil de explicar, impossível de aceitar.